segunda-feira, 13 de julho de 2015

Deserto de estrelas

Às vezes acho que não sei escrever. 
Que só falo em poesia
pra engolir a faca entre os dentes. 
A gengiva tá sempre cortada, 
o dentista diz que eu sinto demais. 
Pudera. 
Nem agora, 
que os lábios estão secos, 
eu cesso de lamber o mundo. 
O frio ainda se aguenta, 
19 graus não pede conjunto de moletom 
mas eu usaria hoje pra me esconder 
atrás das roupas. 
É esquisito isso. 
Tem dia em que só pinto a cara 
e me vejo nua. 
Em outras uso um vestido curto 
pra ficar vendo do buraquinho da casca. 
Todo dia é uma roupa 
e uma história de ficção diferente. 
A cidade tropical 
favorece a montagem 
dos figurinos. 
Em cidades 
de tempo encoberto e chuvoso 
a mesmice toma conta do armário 
porque ninguém  consegue usar 
uma roupa de cor destacada. 
Só se usam as mesmas cores, 
de preferência com sapatos pretos ou caramelo, 
e logo não se distingue nada 
porque todo mundo fica igual. 
Hoje eu quero me esconder 
porque meu sangue jorra 
e me tece nós na garganta. 
Crescem espinhos em meus pés e mãos 
e ao anoitecer, 
serei um cacto 
no deserto das estrelas poluídas. 
É recomendável cautela na aproximação. 
Sou planta feroz e posso ser Vênus 
vampira em teu pescoço, 
à caça de corações insones. 
Dormir só não cansa mais que sonhar. 
Melhor pra quem ativa a consciência do corpo, 
quanto mais cansaço, 
mais renúncia. 
Eu não. 
Trabalho sonhando. 
Por isso exito em dormir. 
Por essas e outras aprecio
travesseiros de cangote e outros suportes afetivos. 
Mas hoje só tenho minha pele seca 
e espinhos para lixar. 
A noite é longa e eu tenho pressa.  

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