quarta-feira, 22 de outubro de 2014

O ciclista e eu

Era preciso avisar
ao ciclista que atravessou
o sinal da avenida Rio Branco
com rua do Ouvidor
nos últimos segundos
do sinal vermelho:
a tua indignação
envernizou o meu fôlego
que andava sem molde
desde a rua Sacadura Cabral.

Não foram aqueles cinco segundos
que quase nos cruzaram
abruptamente;
foram aqueles cinco segundos
parada na escada rangendo os dentes
quando o tempo virou um grifo
na porta esmurrada
pela invasão.

Só queria eu
que o ciclista esquecesse
(ou num murmúrio antropológico,
que ele relativizasse)
a solidão de meus gestos
raivosos.

E soubesse,
que assim como
tantos outros pecados,
a distração é submissa
aos relinchos do amor.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

O primeiro dia

Amanheceu.
Já é Outubro.
As nuvens querem
despencar do céu
mas há uma grossa
camada de uivos
impedindo
o salto.
Esse silêncio
de mármore
impõe aos gestos
uma petulância
desnecessária.
Onde estão
as notas musicais,
abrigo dos meus
murmúrios?
Devem ter fugido
para outro horizonte
onde também se esconde
o espectro
do último sonho
da madrugada.